Metodologia

O projeto será composto
por quatro sub-projetos a serem desenvolvidos em paralelo:
1.
Aquisição de dados micrometeorológicos e limnológicos em tempo real
O Sistema Integrado de Monitoração Ambiental - SIMA - é um conjunto
de hardware e software desenhado para a coleta de dados e a monitoração
em tempo real de sistemas hidrológicos. Para a coleta dos dados,
o SIMA faz uso de um sistema autônomo fundeado, constituído de um
toróide, onde são instalados sensores, eletrônica de armazenamento,
bateria, painel solar e antena de transmissão. Os dados coletados
em intervalo de tempo pré-programado são transmitidos via satélite,
em tempo quase real, para um usuário que pode estar situado até
2500 km distante do ponto de coleta. A associação destas componentes
fornece uma poderosa ferramenta que pode ser empregada no gerenciamento
e controle ambiental de recursos hídricos. Esse sistema foi
desenvolvido a partir de uma parceria entre a Universidade do Vale
do Paraíba e o INPE. A partir de 1995, o projeto foi transferido
para a Neuron Engenharia Ltda. Através de uma parceria com a Diretoria
de Hidrografia e Navegação (DHN) a Neuron construiu um protótipo
do SIMA, que ficou fundeado em águas do litoral do Rio de Janeiro
durante um ano e os dados coletados foram disponibilizados pelo
Programa Nacional de Bóia. Os dados coletados neste período foram
comparados com dados in situ, o que confirmou o bom desempenho do
sistema.
A seleção de variáveis ambientais a ser medida levou em conta os
seguintes aspectos:
- sua relevância para a caracterização dos ambientes aquáticos
- sua relevância como indicador de impacto ambiental (são variáveis
que respondem de forma consistente às alterações no funcionamento
do sistema aquático)
- sua relevância no processo de emissão de gases de efeito estufa
- a viabilidade técnica de obtenção de medidas a partir de plataformas automáticas
Com base nesses critérios, o sistema de medição automática permitirá
monitorar as seguintes variáveis ambientais:
- água: temperatura da água, pH e turbidez, oxigênio e CO2 dissolvidos, condutividade,
nitrato, amônia, profundidade relativa.
- atmosfera: temperatura do ar, pressão
atmosférica, radiação solar, direção e intensidade do vento, direção
e intensidade da corrente, profundidade relativa.
Essas variáveis são medidas por meio de um kit de sensores integrado
às plataformas. O INPE estará trabalhando de forma coordenada com
a equipe de engenharia da Neuron para a especificação dos sensores,
integração do sistema e testes preliminares de desempenho. Estas
atividades serão desenvolvidas nas dependências do laboratório de
mecânica e eletrônica do programa Processos da Hidrosfera da
Coordenação
Geral de Observação da Terra (OBT) do INPE. No total serão construídas
3 plataformas, sendo necessária também a aquisição de 2 kits sobressalentes
empregados na manutenção do sistema e para eventuais trocas.
Por tratar-se de sistema sofisticado, a plataforma deverá ser levada
do INPE para o local de estudo, através de transporte e embalagem
adequados. Devido ao peso da plataforma, o transporte da margem
do reservatório até o ponto de ancoragem necessita de uma embarcação
suficientemente grande, a qual deverá ser alugada com a devida antecedência.
A estratégia de distribuição das plataformas considera a segurança
do experimento e o período total de amostragem. As plataformas deverão
ser ancoradas em local seguro, de preferência próximo à barragem.
A análise de séries temporais requer um grande número de dados numa
mesma série, bem como a ausência de pontos faltantes (missing values).
Com isso, uma plataforma deverá ser instalada permanentemente durante
os seis anos do projeto em um dos reservatórios, ao mesmo tempo
que a outras duas plataformas serão operadas anualmente nos outros
reservatórios em estudo. Sugere-se a instalação da plataforma permanente
em um reservatório mais antigo, como a UHE Furnas, pois em reservatórios
recém formados as flutuações das variáveis não representam a dinâmica
do reservatório a longo termo. Durante a execução do projeto serão
realizadas visitas às plataformas para operações de manutenção do
sistema e para o acoplamento por uma semana de um analisador de
gases traço. Com isso deverá ser possível estabelecer, do ponto
de vista físico e biológico, a relação entre os processos que ocorrem
na interface água-atmosfera e os fluxos de gases de efeito estufa
avaliados (Lima, 2002).
Tendo em vista que a integração da primeira plataforma levará cerca
de seis meses, esta deverá ser lançada na UHE Furnas em Julho de
2003. Na primeira campanha de campo após o lançamento, prevista
para Outubro de 2003, deverão ser coletadas amostras para calibração
e será efetuado o primeiro acoplamento do sensor de gases. Em Janeiro
de 2004 deverão ser lançadas outras duas plataforma na UHE Serra
da Mesa e na UHE Manso. Em Janeiro de 2005 estas plataformas serão
transferidas para as UHEs Itumbiara e Corumbá. Em 2006 as plataformas
operarão nas UHEs Marimbondo e Porto Colômbia e, em 2007, nas UHEs
L.C.B. de Carvalho e Mascarenhas de Moraes. No início de 2008 uma
plataforma será transferida para a UHE Funil e a outra será operada
em outro ponto de diferente profundidade na UHE Furnas, onde já
existe uma plataforma fixa próximo à barragem. De 2004 a 2008 deverão
ser realizadas em cada ano três campanhas de campo por plataforma,
nas fases de enchente (Janeiro), cheia (Julho) e vazante (Outubro),
para instalação da plataforma, manutenção preventiva e calibração
dos sensores, bem como para o acoplamento por uma semana do sensor
de gases. No final do segundo semestre de 2008 deverá também ser
realizada outra campanha de campo, quando os sistemas deverão ser
desligados e desinstalados.
As campanhas de campo do INPE nos meses de Janeiro para instalação,
transposição, manutenção, calibração e coleta de dados serão realizadas
por cinco pesquisadores e nas campanhas nos meses de Julho e Outubro
serão necessários dois pesquisadores (com exceção da última campanha
em 2008, quando haverá a finalização do experimento, necessitando
de 5 pesquisadores).Para realizar as campanhas de campo serão adquiridas
passagens de ida-volta do aeroporto de São José dos Campos com destino
às cidades mais próximas dos reservatórios em estudo.
2. Estimativa de Fluxos de
CO2, CH4 e N2O na interface água-atmosfera
e coluna dágua
Enquanto a combustão de carvão, óleo
combustível ou gás natural em plantas térmicas se produz principalmente
gás carbônico (CO2) através da combustão química, nos
reservatórios de hidrelétricas a principal fonte do gás é a decomposição
bacteriana (aeróbica e anaeróbica) de material orgânico autóctone
e alóctone, que produz basicamente CO2 , CH4.
e N2O. O programa de coletas de amostras de gás emitido
na interface água-atmosfera, tanto sob a forma de bolhas como por
difusão, será montado em função do tipo de região do reservatório
estudado e por faixa de profundidade da área escolhida. As amostras
serão coletadas em campo em diversas regiões dos reservatórios empregando-se
funis de captação de bolhas que emanam do fundo do lago e câmaras
de difusão que captam o transporte vertical dos gases por difusão.
Também deverão ser mensurados perfis de concentração de metano na
coluna d’água. Cada campanha demandará em média 07 dias de trabalho,
sendo o primeiro e o último dia dedicados à deslocamentos e montagem/desmontagem
de material.Para as amostragens serão realizadas duas saídas por
dia para o reservatório, uma prevista para a manhã e outra à tarde.
Deverão ser colocados conjuntos de funis em diferentes profundidades
de regiões significativas dos reservatórios estudados, sendo que
o conjunto instalado permanecerá por cerca de 24 horas em equilíbrio
com a água. Ao final da instalação dos funis se procederá à medição
dos parâmetros físico-químicos da água e as experiências de medição
da difusão dos gases e dos perfis de concentração de CH4
na coluna d’água. Basicamente, serão dispostos os conjuntos de amostragem
em locais significativos dos reservatórios estudados, sendo:
- região próximo à barragem,
em diferentes profundidades (procura-se nesta região do reservatório,
determinar um padrão de emissão para regiões muito profundas e onde
presume-se que foram previamente desmatadas);
- região abrigada do reservatório,
em algum braço de antigo rio e em diferentes profundidades, onde
presumidamente havia vegetação que não foi previamente desmatada
(procura-se nesta região do reservatório, determinar um padrão de
emissão para regiões mais rasas e de intensa atividade biológica);
- região abrigada do reservatório
em diferentes profundidades, em algum braço de rio na região oposta
à amostragem anterior (procura-se nesta região do reservatório,
determinar similaridades ou diferenças no padrão de emissão anteriormente
encontrado);
- região à montante do
reservatório, onde pode ocorrer presença de macrófitas aquáticas
(procura-se determinar um padrão de emissão para áreas onde a presença
de maior carga orgânica possa influenciar nas taxas de emissão,
como também avaliar o padrão de emissão existente anteriormente
à construção do reservatório).
- região à jusante (procura-se
determinar um padrão de emissão para a água captada em profundidade
e turbinada).
Quanto
à análise, o melhor método de análise quantitativa da concentração
dos gases contidas nas amostras coletadas, será o transporte das
amostras em recipientes apropriados e análise posterior em laboratórios
por cromatografia de fase gasosa.
Elementos da amostragem:
Serão quantificados os componentes
(metano, dióxido de carbono, nitrogênio, oxigênio e óxido nitroso)
e serão calculados as taxas de emissão para cada tipo de área, expressas
em kg/km2/dia.
Para cada reservatório estudado serão
combinadas estas taxas de emissão com a proporção de cada área equivalente
amostrada e serão então calculadas taxas de emissão total para cada
represa.
Proceder-se-á também a medição in situ
de fluxos de gases através de analisador de gases traço portátil.
3.
Ciclo do Carbono na coluna d’água
Nos ambientes aquáticos, a maior parte
do carbono está presente nas formas inorgânica e orgânica dissolvidas.
O carbono orgânico particulado representa algo próximo de 10% do
carbono orgânico total e os organismos vivos (biomassa) são responsáveis
por uma pequena parte da fração particulada. O carbono orgânico
particulado referente ao material detrítico (necromassa) é, na maioria
dos casos, rapidamente mineralizado, contribuindo, portanto, para
o pool de carbono dissolvido. Assim como a predominância de carbono
dissolvido em relação a outras formas de carbono é definida por
atividades biológicas (intensas taxas de decomposição facilitadas
por elevadas temperaturas), os fluxos de entrada (absorção) e de
saída (emissão) de carbono inorgânico para a atmosfera também são
regulados por processos biogênicos. O balanço entre esses dois fluxos
é determinado pela magnitude das taxas de respiração e produtividade
primária/secundária. A produtividade primária é responsável por
converter carbono inorgânico (CO2) em carbono orgânico particulado
(formação de biomassa). Todavia, essa mesma produção primária, através
de processos de excreção simultâneos à fotossíntese, transfere carbono
orgânico dissolvido intra-celular para o meio. A produtividade secundária
é desempenhada por bactérias heterotróficas capazes de metabolizar
o carbono orgânico dissolvido e, dessa forma, incorporando-o na
estrutura trófica. Todo essa engrenagem ecológica de
transformações do carbono gerando biomassa tem, evidentemente,
um alto custo energético. As taxas de respiração, com a formação
de CO2,
expressam esse gasto. A análise das eficiências ecológicas,
expressas através da proporção entre produção e respiração,
permite identificar a rota principal do carbono e a atribuição
ecológica do sistema. Se o sistema está predominantemente
funcionando como incorporador de carbono (produção maior que
respiração) é tido como autotrófico. Por outro lado, se o
sistema funciona como exportador de carbono (respiração maior
que produção) é considerado heterotrófico. Esta identificação do
atributo ecológico dos ecossistemas aquáticos – autotrófico ou
heterotrófico – é, ainda, um grande desafio para as ciências
aquáticas. Neste contexto, a avaliação desses dois processos
biológicos, associada à definição da matriz energética –
parâmetros físicos e químicos – é fundamental para a compreensão
e construção do modelo do ciclo do carbono e suas implicações
nas emissões observadas.
Com base nesse escopo, serão obtidos
os seguinte dados:
- Estoques Biológicos de Carbono
- A biomassa fitoplanctônica será obtida
através da análise em microscópio invertido e as densidades serão
transformadas em biomassa através da identificação do biovolume
celular.
- A biomassa bacteriana será obtida através
da anaálise em microscópio de fluorescência e as densidades serão
transformadas em biomassa através de analisador de imagem.
- Processos de Transferência de Carbono
- Produção primária fitoplanctônica será
estimada através da incorporação de carbono radioativo (14C)
de acordo com o procedimento apresentado em Wetzel & Likens (1992).
- Carbono orgânico excretado pelo fitoplâncton
será obtido através do borbulhamento em meio ácido da amostra previamente
filtrada para a avaliação da incorporação intracelular do 14C.
- A produção bacteriana será investigada
através da incorporação de leucina tritiada [3H] pelo
método da centrifugação desenvolvido por Smith e Azam (1992). As
taxas de incorporação serão calculadas conforme adaptação do método
de Bell (1993), originalmente estabelecido para medir a incorporação
de timidina, e convertidas diretamente para produção de carbono
de acordo com Simon e Azam (1989).
- A respiração planctônica – fitoplanctônica
e bacteriana – será realizada simultaneamente utilizando-se um respirômetro
Micro-Oxymax e mensurando-se o consumo de oxigênio dissolvido por
espectrofotometria de acordo com procedimento descrito em Roland
et al. (1999). A separação de plâncton para as medidas das taxas
respiratórias será realizada segundo Cimbleris e Kalff (1998).
- Parâmetros ambientais
- Tais como concentrações
de carbono inorgânico dissolvido (DIC), carbono orgânico dissolvido
(DOC), carbono orgânico particulado (POC), nitrogênio total, fósforo
total, concentração de clorofila-a;
13C de CO2 e CH4 dissolvidos e
13C
15N
do POC, visando diferenciar o material alóctone e autóctone, serão
determinados de acordo com métodos específicos. Variáveis limnológicas
– pH, oxigênio dissolvido, condutividade elétrica, turbidez e temperatura
– serão medidas em campo.
- Quantificação da entrada de material alóctone
- Os principais tributários de cada reservatório serão identificados,
e escolhidos pontos de amostragem para a realização de medidas das
concentrações (mg/L) de DOC e POC. A carga orgânica será então estimada
por meio da medição das áreas de drenagem referentes aos pontos
de amostragem, e da utilização das vazões médias diárias registradas
em estações fluviométricas existentes nas bacias contribuintes ao
reservatório. O trabalho será desenvolvido utilizando-se de cartas
geográficas na escala de 1:50.000, onde se fará a localização dos
pontos de amostragem, visando a delimitação e medição das respectivas
áreas de drenagem. As vazões médias diárias, observadas nos mesmos
dias em que foram realizadas as coletas, serão obtidas nas estações
fluviométricas, cujas áreas de drenagem também devem ser conhecidas.
Em seguida, estima-se uma descarga específica (litros por segundo
por quilometro quadrado) a ser multiplicada pela área de drenagem
dos pontos de amostragem. Concentrações de DOC e POC também serão
avaliadas imediatamente a jusante de cada reservatório.
4. Estimativa de Fluxos de CO2, CH4 e nitrogênio
(N2) na interface água-sedimento
Uma grande parte dos gases de efeito estufa é originada da decomposição
da matéria orgânica presente nos sedimentos anóxicos, os quais portanto
constituem-se em componente fundamental nas transformações de carbono
e nitrogênio nos ambientes aquáticos. Os sedimentos serão
coletados (Adams, 1994) em locais equivalentes aos pontos onde serão
efetuadas as coletas na coluna d’água e superfície, e analisados
os seguintes gases na água intersticial: CO2, CH4,
N2, oxigênio (O2) e argônio (Ar). As amostras,
mantidas no interior do coletor, são preservadas em sacos preenchidos
com gás hélio (Fendinger & Adams, 1986), e em intervalos de 1 a
2 cm, transferidas para um sistema de seringas adaptadas ao coletor.
Essas seringas são, então, estocadas em sacos com hélio e mantidas
em gelo, sendo as análises dos gases processadas, por meio de cromatografia
gasosa, em um período de 24 a 48 horas após as coletas. As medidas
de oxigênio e argônio são utilizadas como indicadores de contaminação
atmosférica das amostras. O argônio é utilizado ainda para aumentar
a acurácia das medidas de N2. Serão quantificados os
fluxos difusivos de CO2, CH4, N2
nos sedimentos e na interface água-sedimento, de modo
a avaliar a perda desses gases para a coluna d’água e o seu potencial
de desoxigenação e denitrificação das águas hipolimnéticas, bem
como o seu fluxo para a atmosfera.
A composição isotópica do carbono e
nitrogênio, presentes nos sedimentos, também será avaliada.